Em artigo publicado na Folha de S.Paulo, o diretor da UGAB Brasil, Haig Apovian, escreve sobre a atual situação de Artsakh, onde desde o dia 12 de dezembro mais de 120 mil pessoas que vivem na região estão sitiadas devido a um bloqueio coordenado pelo governo do Azerbaijão. Confira na íntegra o texto:

“Comunidade internacional precisa agir para evitar novo genocídio armênio
Reconhecer independência da República de Artsakh em 2122 pode ser tarde demais

Desde o dia 12 de dezembro, mais de 120 mil pessoas que vivem em Artsakh [Nagorno-Karabakh] estão sitiadas devido a um bloqueio coordenado pelo governo do Azerbaijão, que isola a região do mundo exterior, deixando toda a população, incluindo idosos, pacientes internados e mais de 30 mil crianças, sem acesso a alimentos, remédios, combustíveis e itens de necessidades básicas no meio do inverno.

Por três dias, o fornecimento de gás, fundamental para o aquecimento, também foi cortado, mas restabelecido após repreensões por parte de governos ocidentais. O bloqueio quer impor à população armênia, que habita a região há milhares de anos, a ideia de que a continuidade em suas terras ancestrais não é mais viável e faz parte de uma tática orquestrada de limpeza étnica e eliminação do povo armênio.

Ironicamente, no momento em que o mundo celebra as festas de fim de ano, os armênios, primeiro povo cristão do mundo, enfrentam o período natalino lutando mais uma vez pela sua sobrevivência —pouco mais de cem anos após o evento que ficou conhecido como o primeiro genocídio do século 20.

O genocídio armênio, cometido pelo império otomano e exemplo utilizado quando foi cunhado o próprio termo genocídio, é amplamente reconhecido pela maioria das nações ocidentais e órgãos internacionais, mas é negado veementemente até os dias de hoje pela Turquia e seu Estado satélite, o Azerbaijão.

O termo, que descreve uma ação deliberada para eliminação de uma nação ou grupo étnico, reflete as ações praticadas atualmente pelo governo de Baku.

Sob o falso pretexto de serem “ecoativistas”, “manifestantes” bloqueiam a única via que conecta Artsakh à República da Armênia e impedem a entrada de insumos básicos à sobrevivência e a saída de cidadãos da República de Artsakh, efetivamente condenando à morte pessoas que precisam de cuidados. Essa situação já ocorreu nos últimos dias com pacientes internados em UTIs na capital da região, Stepanakert.

Diversos dos supostos manifestantes foram identificados como pessoas ligadas a grupos extremistas e agentes das forças especiais com elos com o governo de Baku, em flagrante contraste ao tratamento dispensado a manifestantes reais, recorrentemente presos e perseguidos pelo governo do Azerbaijão.

O Azerbaijão, uma petroditadura que possui um dos piores índices no mundo em corrupção e liberdade de imprensa e um longo histórico de agressão a opositores e minorias, possui reais problemas ambientais, especialmente na costa do mar Cáspio, onde estão os campos de exploração de petróleo e gás.

Mas lá, ao contrário do que ocorre nas falsas manifestações, não há espaço para ações legítimas de proteção à natureza e direitos humanos. Ao contrário da atenção e cobertura que as agressões sofridas pela Ucrânia estão recebendo, os mais de 120 mil armênios de Nagorno-Karabakh estão abandonados à própria sorte, sufocados lentamente por um dos governos mais repressores e violentos do mundo, que em 2020 lançou uma guerra em plena pandemia, matando mais de 5.000 armênios.

É fundamental que governos e órgãos de todo o mundo civilizado se manifestem contra a agressão deliberada sofrida pela população de Artsakh, a fim de evitar a repetição da história com um novo genocídio. Em agosto de 1939, antes de invadir a Polônia, como justificativa para a impunidade do que seria cometido, Hitler teria dito: “Quem hoje se lembra dos armênios?”.

É hora de reconhecer a independência da República de Artsakh e se manifestar pelo direito do povo armênio de viver em paz em suas terras! Reconhecer o fato em 2122 pode ser tarde demais!”

 

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